quanto mais o trem sobe no mapa [ou desce para os chamados 'países baixos', depende do referencial], mais linda vai ficando a paisagem. saca aquela casinha do exame de vista? aquela casinha vermelha láaaaaa no fundo de um pasto verde [deve ser para ver se a gente é daltônico!]? pois. na vida real ela fica em algum ponto do caminho entre bruxelas e amsterdam. eu vi. fora desta época, dizem que o tapete de neve dá lugar a um tapete de tulipas coloridas, e o que já é lindo fica encantador. cheguei em amsterdam quando já era noite. chovia e, depois da experiência em bruxelas, só deixei a estação devidamente munida de um mapa da cidade [esse aí que seguro na foto!], que solicitei e imprimi numa máquina, a custo zero, ali mesmo. do lado de fora, uma casinha exclusivamente destinada a fornecer informações previne que a cidade recebe mais turistas do que gente. fui até lá, perguntar para que lado ficava o número 12 da prins hendrikkade, onde estava o nosso hotel. fui prontamente atendida por uma holandesinha igual a boneca heidi que ganhei da minha mãe quando tinha uns 9 anos. o mesmo tom de cabelo loiro e a mesma roupinha quadriculada em azul claro e branco. muito solícita e simpática, ela me deu a excelente notícia: 'it´s not far from here'. atravessamos a ponte sobre o canal na frente da estação e viramos à direita, no meio de tanta gente que mais parecia a ladeira porto geral, só que com malas. andamos uns dois quarteirões, reconhecendo, como num déjà vu, a placa em neon azul que já havíamos visto no assustador google maps 3d. foi só o tempo de fazer o check in, subir para inspecionar o quarto [e o banheiro, naturalmente!], deixar as malas e descer para ir ver a cidade. caminhamos rumo a damrak, ponto de referência absoluto em amsterdam. seguimos o fluxo, debaixo de uma fina garoa, num frio de rachar, até a dam place - que, francamente, depois da grand place não pode impressionar ninguém. viramos à esquerda, aleatoriamente, e nos embrenhamos por entre casinhas, canais, pontes e muitas bicicletas. de repente, as luzes foram ficando vermelhas e a freqüência um tanto duvidosa. estávamos no coração do famoso red light district, onde mulheres de calcinha e sutiã se oferecem nas vitrines como carne no açougue e estranhamente falam ao celular. vi uma cicciolina com peitos do tamanho de bolas de basquete, uma gorda bizarra, uma velha se maquiando e uma só moça [moça?] bonita, que pelo biotipo devia ser latina, ou do leste europeu, vai saber. todas, rigorosamente todas, falando pelo celular. achei aquilo deprimente, malgrado todo o discurso anti-hipócrita que possa ser usado em defesa. quem me conhece, e já teve comigo uma discussão a respeito numa mesa de bar, sabe o que eu penso sobre sexo comprado. tentei manter o foco nos milhares de cisnes brancos que, concentrados bem ali naquele ponto do canal, contrastavam com a escuridão, em sentido denotativo e conotativo, do bairro. no dia seguinte, aberto pela chuva da noite anterior, mas nem por isso menos frio, caminhei pela cidade, deliciosamente plana, admirando suas lindas casas e seus típicos e múltiplos canais, até chegar à rembrandt huis, minha única exigência na cidade, que tem ainda os imperdíveis van gogh museum, rijksmuseum, e a anne frank huis, que ficaram para uma próxima vez. os dois primeiros, porque não havia tempo suficiente para desfrutá-los de maneira decente, e a casa da anne frank porque tinha uma fila de no mínimo duas horas, sem exagero, impossível de ser encarada debaixo de um frio de -2º, com sensação térmica de uns -10º. rembrandt é meu pintor holandês favorito. rembrandt é, aliás, um de meus pintores favoritos de todas as nacionalidades, perdendo, talvez, apenas para alguns espanhóis, que são o meu fraco. gosto de seu jogo de luzes e sombras, sou absolutamente fascinada por sua técnica e estar naquela que foi a sua casa, naquele que foi o seu ateliê, e me ver refletida no espelho que refletiu sua imagem foi de uma emoção indescritível. a europa tem dessas coisas, já diria meu amigo jorgê. depois de sair de lá, com a sensação de que amsterdam já tinha valido, muito, a pena, mesmo se acabasse ali, passei na kipling da heiligeweg, onde comprei, por 124 euros, a mesma bolsa de couro camel que havia visto, por 248, na loja matriz em bruxelas, 24 horas antes [a moça da loja de bruxelas me deu a dica de que em amsterdam já haviam começado os saldos da estação - e que saldos!]. depois, fui encontrar com a dê e o jan-hein no heineken hoek café da leidseplein. dê foi minha professora de ballet a vida inteira, dos 7 aos 24. ela casou com o jan há uns 6 anos, e foi morar em rotterdam. fazia pelo menos 3 que não nos víamos, desde a última vez que ela esteve em fortaleza e que reunimos todo o corpo de baile aposentado num café da historiador raimundo girão. quando eu soube que iria passar pela holanda, mandei logo um email para ela, que se programou toda e foi passar o dia comigo. foi lindo revê-la e, como ela é um pouco minha mãe, senti-me acolhida, protegida, mimada. pegamos um barco e demos a volta completa pelos canais, enquanto ela e o jan nos mostravam tudo e nos davam uma verdadeira aula sobre a holanda. depois, fomos ver as vitrines da rua mais cara de amsterdam - a pieter cornelisz hooftstraat - e jantamos num restaurante grego com nome de cueca. terminamos o dia nos despedindo em frente ao hotel, com lágrimas nos olhos, as duas. eu, pela gratidão imensa que sinto por ela. por tudo, e especialmente pelo carinho recebido neste dia lindo que passamos juntas em amsterdam. ela, dizendo-me do orgulho que era me ver assim, adulta, tendo acertado o rumo na vida. dê é a brasileira mais européia que conheço. ela não tem globo internacional e se ufana por viver num país em que há justiça social, o salário mínimo é digno e os idosos são respeitados. o único que realmente lamenta é não viver em viena - imaginem vocês! ela parece dura na queda, mas é das melhores criaturas que conheço. quando nos abraçamos na frente do hotel, me entregou um envelope com 300 euros [que ela pediu aos amigos holandeses de presente de aniversário, dias antes], pedindo-me que eu fizesse chegar à casa do menino jesus - dinheiro que já foi devidamente convertido em cerâmica e outros materiais de construção, que era o que mais eles estavam precisando no momento. no dia seguinte, o último na cidade, caminhei calmamente, deliciando-me com cada detalhe, de cada casinha, parando vez por outra para me esquentar num café ou me refazer do susto de quase ter sido atropelada por uma bicicleta, até a hora de pegar um táxi e rumar para o aeroporto de schiphol, de onde voei para a segunda parte das minhas férias, em portugal.
próxima parada: lisboa.
2 comentários:
O 'bom' de não dar tempo de visitar tudo é que aí a gente tem que voltar pra ver, né? A casa de Anne Frank me impressionou muito. Não sou muito fãzona de Rembrandt, mas é realmente imperdível. Uma das minhas paixões é mesmo o museu Van Gogh - é incrível quantos Van Goghs viveram dentro de um pintor só. E estão todos lá, pra gente conhecer...
bjk
Mônica
Minha querida Candice!! Que bom ler seus textos novamente! : ) Quer dizer, tentar ler, né? Com a Gabi me chamando toda hora, eu tenho que ler picadinho. Rssss
Um beijo grande pra vc!!
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