não me desejem feliz dia 11 de agosto, queridos. porque, a despeito de ter um número de inscrição na oab, não me sinto advogada. nunca me senti e, a bem da verdade, preciso dizer que, com o passar do tempo e o caminhar da vida, sinto-me cada vez menos.* e não seria exatamente correto dizer que faltou-me tentativa. mais honesto, certamente, seria admitir que, a despeito de minha relativa boa-vontade, todas as tentativas de assumir a profissão me restaram absolutamente infrutíferas. a mais recente delas, inclusive, deixando-me, a mim e à minha pretensa sócia, com um estoque de 300 cartões de visita verticais, muito bem elaborados, em tons de laranja, café e prata, nos quais se lê barroso nóbrega advogadas associadas e um número de telefone que acabou encontrando outra serventia. em contrapartida, estejam a vontade para me desejar feliz dia 15 de outubro, porque me sinto cada vez mais professora. cada vez mais consciente da inconsciência divina da escolha que fiz aos 17, quando eu sequer pressentia a importância dela na formação da minha persona. desejem-me feliz dia 15 de outubro, queridos, porque preencho cada vez com menos hesitação o campo 'profissão' dos formulários que, vez por outra, me toca preencher. e escrevo, onde muitas vezes só caberia a palavra 'advogada', com muito orgulho e absoluta convicção: 'professora universitária'. outro dia, pensando a respeito, percebi que acabei repetindo a história profissional de meu avô oscar, pai da minha mãe. professor oscar, um ser especialíssimo que formou-se em direito [sem jamais advogar], fundou um colégio, viajou o mundo, publicou três livros de poesia e acabou sabiamente seus dias cortando bananeiras na serra de ibiapaba. e eu, que levo todas as coisas muito a sério nesta vida, senti uma responsabilidade imensa nesta espécie de continuidade que sou de meu avô. e fico feliz, meu povo, tanto que quase não caibo em mim, quando percebo que dou para a coisa, que estou no lugar certo, que poucas coisas me cairiam melhor do que um pincel atômico nas mãos, que minha voz é boa e meu vocabulário apropriado, que meus alunos me consideram articulada e eloquente [de longe os melhores elogios profissionais que já recebi], e que riem de mim, e me acham meio doida, quando faço minhas graças para que eles aguentem firme até o final da aula, o final do mês, o final do semestre.
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*em tempo: gostaria de esclarecer que, contrariando a nota que saiu hoje num jornal daqui, não estou apoiando especificamente ninguém para as próximas eleições da ordem. na verdade, não tenho idéia de porque meu nome saiu naquela listagem, se nem votar eu voto, já que solicitei a suspensão temporária do meu número [e do respectivo pagamento] da oab por não estar exercendo a profissão. registre-se, no entanto, que não tenho absolutamente nada contra o candidato, embora não tenha achado correta a utilização não autorizada [sequer consultada] de meu nome e do de outros colegas. não apóio ninguém e apóio a todos. faço questão de não me envolver no jogo de vaidades e troca de interesses que são estes pleitos. espero, apenas, que vença o melhor. ou que, se não, faça o melhor aquele que vencer.